24/10/2012

Capítulo 78 - Uma obra, mil autores

Esta é a minha participação em Uma obra, mil autore. Uma iniciativa de Pedro Chagas Freitas aberta a todos os que gostam de escreVIVER.



Capítulo 78

(Luisa Vaz Tavares)

Era, agora, só um. Ou menos que um. Afinal que nesta aritmética do amor o resultado nunca é linear. As perdas são sempre mais perdas e os ganhos maiores que um simples algarismo. Ou dois. Ou três, ou quantos cabem num universo.

Ai, Madalena, Madalena… quantos dos nossos sonhos se esfumaram!... E porquê? Porquê? Diz-me porquê. Porque sucumbimos nós às convenções de uma sociedade retrógrada? À mesquinhez dos espíritos, ao espartilhamento das almas, às aparências ostensivas de felicidade. O nosso pecado era amar. Tão só isso, amar! Procurámos refúgios e subterfúgios para que ninguém nos condenasse na pureza do nosso segredo, tolerámos gajos nas nossas camas. Coitados, não sabiam eles que eram as máscaras das nossas essências, daquilo que verdadeiramente eramos. Amantes de espírito e alma. Pois, que o corpo é fácil de partilhar, agora a alma, isso já é outra coisa. Partilhar a alma é a profundidade que rompe a pele.

O Luís, lembras-te do Luís? Encontrei-o logo ao sair da prisão. Foi dos poucos que me rompeu a pele. Ainda cheguei a pensar que me apaixonaria por ele, mas não, não era esse o meu credo. O meu corpo, a minha alma, todo o meu Ser, rezava por outra cartilha. A tua cartilha, Madalena. A nossa. Aquela que escondíamos no meio dos nossos lençóis, embrenhada na lascívia do nosso segredo. Nunca a lascívia se apresentou tão pura. Sim, que o nosso amor era puro. Apenas profanado pelo segredo de uma sociedade hipócrita.

Quanta hipocrisia, meu amor! Quisemos ludibriar o destino e foi ele que nos ludibriou a nós. Separando-nos sempre. Primeiro por aqueles muros da prisão, e agora… ai agora, separou-nos pela ténue linha da vida.

O que é que eu faço, minha Madalena? Continuo a fingir que a palavra lésbica não é o conceito que me define? Ou dispo o meu corpo para que o mundo o coma enquanto trespasso a linha da vida? E… espera por mim, Madalena!

- Teresa… Teresa… acorda mulher. Vá lá, que tens de ir à polícia. Querem-te lá…